Provérbios Provados noutras casas:

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Provérbio doente

O António era um hipocondríaco dos sete costados, com eles todos bem colocados para mal dos seus pecados. Um médico de clínica geral para os atestados, mais o dentista, o reumatologista, o endocrinologista, o urologista e outros mais não identificados.
Naquela clínica que oferecia todas as especialidades era sobejamente conhecido, e não apenas pela psicoterapia semanal, pelo constante fazer/levantar exames, indagar por horas de consultas e querer experimentar médicos novos – para ouvir uma segunda opinião, frase que na sua boca se tornara um chavão.
Administrativos, radiologistas, médicos e pessoal das limpezas sem excepção, repartiam-se em frases já rotineiras:
- Bom dia António, em que posso ajudá-lo?
- Olá António, então veio para marcar uma consultinha?
- Boa tarde António, ora por cá de novo, não é verdade?
Na verdade, António não tinha nada de grave. Aqui e ali um valor nas análises normal para a idade. E o psiquiatra continuava a receitar-lhe benzodiepinas porque um aperto no peito não o deixava dormir.

- Nem com cada mal ao médico, nem com cada dúvida ao letrado

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Provérbio com preço

Enviaram-me este texto em formato de diálogo para o e-mail e desconheço a sua autoria, mas achei-lhe graça e lembrou-me imediatamente um provérbio, como não podia deixar de ser :)


Os carros, as SCUTs, o Contribuinte e o Estado‏

Contribuinte - Gostava de comprar um carro.
Estado - Muito bem. Faça o favor de escolher.
Contribuinte - Já escolhi tenho que pagar alguma coisa?
Estado - Sim. De acordo com o valor do carro (IVA)
Contribuinte - Ah. Só isso.
Estado - e uma "coisinha" para o por a circular (selo)
Contribuinte - Ah!
Estado - e mais uma coisinha na gasolina necessária para que o carro efectivamente circule (ISP)
Contribuinte - mas sem gasolina eu não circulo.
Estado - Eu sei.
Contribuinte - mas eu já pago para circular.
Estado - claro.
Contribuinte - então vai cobrar-me pelo valor da gasolina?
Estado - também. mas isso é o IVA. o ISP é outra coisa diferente.
Contribuinte - diferente?
Estado - muito. o ISP é porque a gasolina existe.
Contribuinte - porque existe?
Estado - há muitos milhões de anos os dinossauros e o carvão fizeram petroleo. e você paga.
Contribuinte - só isso?
Estado - Só. Mas não julgue que pode deixar o carro assim como quer.
Contribuinte - como assim?
Estado - Tem que pagar para o estacionar.
Contribuinte - para o estacionar?
Estado - Exacto.
Contribuinte - Portanto pago para andar e pago para estar parado?
Estado - Não. Se quiser mesmo andar com o carro precisa de pagar seguro.
Contribuinte - Então pago para circular, pago para conseguir circular e pago por estar parado.
Estado - Sim. Nós não estamos aqui para enganar ninguém. O carro é novo?
Contribuinte - Novo?
Estado - é que se não for novo tem que pagar para vermos se ele está em condições de andar por aí.
Contribuinte - Pago para você ver se pode cobrar?
Estado - Claro. Acha que isso é de borla? Só há mais uma coisinha...
Contribuinte - Mais uma coisinha?
Estado - Para circular em auto-estradas
Contribuinte - mas eu já pago imposto de circulação.
Estado - mas esta é uma circulação diferente.
Contribuinte - Diferente?
Estado - Sim. Muito diferente. É só para quem quiser.
Contribuinte - Só mais isso?
Estado - Sim. Só mais isso.
Contribuinte - E acabou?
Estado - Sim. Depois de pagar os 25 euros acabou.
Contribuinte - Quais 25 euros?
Estado - Os 25 euros que custa pagar para andar nas auto-estradas.
Contribuinte - Mas não disse que as auto-estradas eram só para quem quisesse?
Estado - Sim. Mas todos pagam os 25 euros.
Contribuinte - Quais 25 euros?
Estado - Os 25 euros é quanto custa.
Contribuinte - custa o quê?
Estado - Pagar.
Contribuinte - custa pagar?
Estado - sim. Pagar custa 25 euros.
Contribuinte - Pagar custa 25 euros?
Estado - Sim. Paga 25 euros para pagar.
Contribuinte - Mas eu não vou circular nas auto-estradas.
Estado - Imagine que um dia quer...tem que pagar
Contribuinte - tenho que pagar para pagar porque um dia posso querer?
Estado - Exactamente. Você paga para pagar o que um dia pode querer.
Contribuinte - E se eu não quiser?
Estado - Paga multa.


- Paga o justo pelo pecador

terça-feira, 20 de julho de 2010

Provérbio açucarado

Óscar pertencia àquela linhagem de homens que sabem como falar com as mulheres. Dominava com habilidade a arte de as fazer sentirem-se únicas pois sabia mimá-las com precisão. A sua popularidade residia por isso mesmo no facto de lhes dizer exactamente o que gostariam de ouvir sem exageros; aliás Óscar nunca mentia: por exemplo a uma mulher muito bela podia atirar-lhe confortavelmente com o adjectivo linda ou sexy sem lhe achar desconfiança, mas por outro lado a outra menos favorecida pela natureza os atributos interessante, meiga, ou até fofinha – numa versão menos abonatória, mas igualmente eficaz - funcionavam sempre bem.
Por ser bem-falante e muito observador, controlava com mestria a arte do flirt; mas não exactamente com o intuito de chegar a vias de facto, já que Óscar era casado e muitas das vezes também o eram as suas interlocutoras. Um homem de duas caras, de vários bonés? Talvez não…, o que o movia era um altruísmo todo ele dedicado a tornar com elogios o género feminino mais feliz e uma certa vaidade pessoal quando lia nos olhos delas o reconhecimento.

- O que é doce nunca amargou

domingo, 18 de julho de 2010

Provérbio bocal e boçal

Quando pela primeira vez estabeleci contacto com Madalena ela estava integrada num pacote com cerca de vinte caras novas, e como tal não me apercebi imediatamente que era uma personagem digna de figurar num romance. Mas certa de que com ela tenho de conviver diariamente, estacionei facilmente nessa conclusão ao cabo de mais ou menos uma semana, posição em que permaneço e donde me parece difícil que me arrede; resta perceber se o mencionado romance satírico, se trágico, se talvez e apenas só cómico e digno até de algum dó.
Madalena é totalmente destituída de modos e cordialidade, vira a cara para não dar os bons-dias, é rude para quem com ela trabalha, mais brusca ainda no atendimento ao público. Colecciona reclamações no livro que lhes é destinado sem aparente remorso. Madalena come de boca aberta, mesmo quando fala, e nunca a fecha em nenhuma ocasião, é capaz de passar horas a arengar: se enfrenta o computador implica com o rato e trata o teclado à cacetada. Se tem que solicitar algo desconhece a expressão “se faz favor” e não a remata com um “obrigada”. Aliás, Madalena não fala, grunhe; não pede, cospe.
Nem toda a gente tem a mesma opinião de Madalena, há que conhecê-la, há que compreendê-la, dizem-me. Vejo-as aos dois beijinhos logo pela manhã e cheira-me a um afecto conquistado à custa de muitos anos de convívio forçado. Talvez lá chegue um dia, toda a gente com a sua atrabile, os seus dias mais biliosos, há que conhecer-me também, mesmo a Madalena que afirma que nunca mudará por ninguém.
Para já, Madalena detesta-me com a sua forma de repulsão muito visceral, só me dirige a palavra quando me apanha em falta para me rezingar algo como “a menina quando não sabe, pergunta”. Como se eu lhe fosse perguntar alguma coisa, tenho medo que me acerte num olho…

- Pela boca morre o peixe